Ética e Direitos Humanos

            É possível afirmar que a questão dos Direitos Humanos não é apenas uma questão social, política ou jurídica. Existe uma relação muito estreita entre os Direitos Fundamentais a todo e qualquer indivíduo e a Ética. Se, do ponto de vista jurídico, podemos dizer que ao Poder Judiciário compete impedir que os Direitos Humanos sejam violados; se, do ponto de vista Político e Social podemos afirmar que é preciso considerar quais políticas públicas e de Estado são as "melhores" para garantir o acesso a estes Direitos Fundamentais, também podemos dizer que existe um compromisso Ético na questão dos Direitos Humanos: a luta por tais Direitos deve ser entendida como uma poderosa ferramenta de transformação social, com o objetivo de construir uma sociedade justa e solidária; no fundamento dos direitos humanos, existe uma determinada ética, uma determinada concepção do homem, uma determinada concepção do que é bem e daquilo que é mal.

            Considerar os Direitos Humanos como um desdobramento da ética significa, de modo direto e evidente, falar em valores como o direito à vida, a paz, a dignidade humana, a justiça social, o desenvolvimento, a Democracia e, porque não dizer, o direito a felicidade. Além disso, uma cultura de Direitos Humanos também pressupõe uma discussão em torno de questões axiológicas e valorativas como a tolerância, o diálogo, a cidadania, o respeito a diversidade, entre outros.

            As nossas lutas não são apenas sociais e coletivas, mas individuais, e  visam o reconhecimento de nossa condição humana, da nossa dignidade e das nossas potencialidades. Ao se privar contingentes humanos de seus direitos básicos se está  negando-lhes a cidadania  e  tornando-os  política, socialmente  e individualmente impotentes. Por isso somos todos chamados a uma  participação ética, ativa e co-responsável, na garantia dos Direitos Fundamentais à existência humana.

            Desta forma, é preciso pensar não só Políticas Públicas que garantam o acesso de todos aos Direitos asegurados pela Constituição Federal, como também uma cidadania, eticamente comprometida com a realidade e a transformação social. Uma Política de Direitos Humanos, com base na ética e na participação cidadã, que garanta aos indivíduos a condição de ser no plano econômico, um cidadão sadio, no plano político, um cidadão participante, no plano intelectual, um cidadão consciente das relações de poder, e no plano da ética um cidadão comprometido com a realidade social.



Ética, Cidadania e Justiça Social: Educar para os Direitos Humanos


            Em 2011 realizamos um Curso de Extensão intitulado ÉTICA, CIDADANIA E JUSTIÇA SOCIAL: EDUCAR PARA OS DIREITOS HUMANOS que teve como eixo central o princípio de articular a ideia de uma cidadania, eticamente comprometida com a realidade social, consciente de seus direitos e deveres, sobretudo no que diz respeito a equidade, igualdade e justiça social.

            Em meio a tantos problemas e crises vivenciados pela nossa sociedade – crise política, crise econômica, crise social, corrupção, violência etc. – constatamos que a ética vem ganhando espaço nos mais diferentes setores da sociedade, seja na área empresarial e comercial, na área profissional, na pesquisa, na área médica, ambiental (hoje em dia fala-se em ética empresarial, ética profissional, conselhos de ética, comitês de ética em pesquisa, bioética, ética ambiental, só para citar alguns casos mais relevantes), ou seja, estamos presenciando, se assim podemos nos exprimir, o surgimento de uma “cultura de ética no País”.

            Por outro lado, o homem é um ser social dotado de direitos fundamentais: direitos políticos, sociais, econômicos, civis. Não caberia aqui uma análise detalhada de cada um destes aspectos que garantem ao indivíduo, pelo menos em tese, sua condição de cidadão no sentido contemporâneo do termo. Comumente associasse cidadania a consciência de direitos e deveres em um estado democrático.

            Diante da complexidade dos problemas que envolvem a sociedade atual faz-se necessário conscientizar os indivíduos do processo do qual fazem parte, por isso, trabalhamos com um conceito de cidadania que se concretiza na efetiva participação da realidade social e no gozo dos direitos individuais e sociais, sendo que neste último aspecto, nos limitamos a trabalhar com a ideia de cidadania civil (afirmação de valores cívicos como igualdade, liberdade, respeito, solidariedade, diálogo) e cidadania social (que compreende a justiça social como exigência ética da sociedade para o bem viver).

            Este curso teve como base teórica alguns pressupostos e ideias filosóficas, para se tratar de temas como a ética, o conceito de cidadania e de justiça social. Tomamos como base, de início, as ideias do filósofo grego Aristóteles. Em sua obra A Política, Aristóteles trabalha, no Livro III, com o conceito de cidadão. Para o filósofo grego, o cidadão é, sobretudo, o indivíduo que participa da coisa pública (res pública); é cidadão aquele que possui uma participação efetiva e está sempre em relação com o Estado. E é o mesmo Aristóteles quem nos permite associar o conceito de cidadania com a ética, pois o cidadão virtuoso está sempre em busca da prosperidade do Estado. Na República perfeita, diz o filósofo, o cidadão é aquele que pode e quer, livremente, obedecer e governar, simultaneamente, em conformidade com os preceitos da virtude. 

            Complementamos essa relação entre a virtude dos indivíduos (e mais especificamente do cidadão) e a organização social com o Livro IV de A República de Platão, falando das virtudes necessárias a uma boa organização social, a saber: a sabedoria, a coragem, a temperança e a justiça. Esta última virtude, a justiça, foi o ponto de ligação para podermos relacionar os três aspectos essenciais deste curso: a ética, a cidadania, e a justiça social. Incluímos nesta discussão a obra Ética à Nicômaco, de Aristóteles, onde o filósofo apresenta, no Livro V, uma discussão mais pormenorizada sobre o conceito de justiça, sobretudo o conceito de justiça política.

            Sob uma perspectiva mais atual e contemporânea, fizemos uma análise das teorias da filósofa alemã Hannah Arendt, destacando sua trajetória como teórica-política, trazendo valiosas contribuições filosóficas no que diz respeito à ética, como resultado de uma prática livre e ativa do indivíduo na esfera pública, onde este exerce a sua cidadania. Como uma autêntica filósofa aristotélica, Arendt salienta em sua obra Responsabilidade e Julgamento, como o homem público com uma alta capacidade de bem julgar, alcança a justiça social. Nesta obra, Arendt reflete sobre a importância da liberdade do pensar individual, pondo no querer e no julgar as características de uma responsabilidade coletiva. Em sua obra A Condição Humana, no capítulo que aborda a ação como elemento concretizante do ser humano, Arendt nos conduz por um fio reflexivo sobre a capacidade única de o homem ser um ente ativo e capaz de influenciar no viver da coletividade.

             Com base nestas ideias, este curso pretendeu promover a interação entre a Universidade e a comunidade parintinense, contribuindo com o seu desenvolvimento, no sentido de conscientizar as pessoas sobre o seu papel de cidadão ativo e transformador da realidade social, com ideias que possam orientar suas ações no mesmo sentido de uma práxis filosófica, uma ação consciente que pressupõe a teoria e a reflexão, articulando a participação acadêmica com a comunidade parintinense, assegurando relações transformadoras entre a universidade e a sociedade.

 

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