Administração Pública

por Alexsandro M. Medeiros

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postado em 2013

atualizado em mai. 2017

            A administração pública se refere ao aparelho estatal, ou seja, ao conjunto formado por um governo e seus agentes administrativos, regulado por um ordenamento jurídico (BRESSER PEREIRA, 1995), que consiste no conjunto das normas, leis e funções existentes para organizar a administração do Estado em todas as suas instâncias e tem como principal objetivo o interesse público, seguindo os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (BRASIL, 2015, art. 37).

  • O princípio da Legalidade representa uma garantia para os administrados, pois qualquer ato da Administração Pública somente terá validade se respaldado em lei. Representa um limite para a atuação do Estado, visando à proteção do administrado em relação ao abuso de poder.
  • O princípio da Impessoalidade deve ser observado em duas situações distintas:

1) em relação aos administrados: significa que a administração pública não poderá atuar discriminando pessoas de forma gratuita, a não serem aquelas que venham privilegiar o interesse público, ou seja, a Administração Pública deve permanecer numa posição de neutralidade em relação às pessoas privadas.

2) em relação à própria Administração Pública: a responsabilidade deve ser imputada ao órgão/pessoa jurídica e não ao agente público.

  • Princípio da Moralidade, o ato e a atividade da administração pública devem obedecer não só à lei, mas também à moral. Todo aquele que objetivar algum tipo de vantagem patrimonial indevida, em razão de cargo, mandato, emprego ou função que exerce, estará praticando ato de improbidade administrativa. Exemplos: usar bens e equipamentos públicos com finalidade particular; intermediar liberação de verbas; estabelecer contratação direta quando a lei manda licitar; vender bem público abaixo do valor de mercado; adquirir bens acima do valor de mercado (superfaturamento).
  • O Princípio da Publicidade é a obrigação, o dever atribuído à Administração de dar total transparência a todos os atos que praticar, ou seja, como regra geral, nenhum ato administrativo pode ser sigiloso.
  • O Princípio da Eficiência busca resultados e visa atender o interesse público com maior eficiência.                   

 

            A função desses princípios (veja mais em Princípios da Administração Pública) é a de dar unidade e coerência à Administração Pública, em relação direta com o Direito Administrativo, controlando as atividades administrativas de todos os entes que integram a federação brasileira (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). A Administração Pública exerce suas funções por meio de seus agentes, órgãos, entes e atividades públicas, garantindo a direta e imediata realização plena dos fins alçados pelo Estado. A Administração Pública sempre será exercida em harmonia com os princípios que regem o Direito Administrativo, sendo que as ações que os contrariem serão invalidadas. De acordo com a Constituição Federal a instituição, alteração, estruturação e atribuição de competência dos órgãos da Administração Pública devem ser norteadas por lei ou normas regulamentadoras (princípio da legalidade). A função dos princípios é oferecer diretrizes, uma espécie de bússola a ser seguida.

            No Direito existe uma diferenciação entre princípios e regras. Analisando tal distinção Madeira (2014, p. 18) pondera que os princípios jurídicos são hierarquicamente superiores as regras e estas não podem ser interpretadas à revelia daqueles. E quando não existe uma regra específica para regular uma determinada situação, deve-se utilizar dos princípios. “Nunca, nos Estados de Direito, invocou-se tanto os princípios, podendo-se mesmo afirmar que se está diante da era principiológica do Direito”. Diante de tais ponderações Madeira (2014, p. 19) afirma então que os princípios jurídicos “representam os valores materiais eleitos pela própria sociedade como justiça, sendo a partir desses valores que esses princípios se erigem [...] um padrão que há de ser observado”. Os princípios jurídicos são preceitos vinculados aos valores fundantes de uma determinada sociedade e expressa, nessa sociedade, sua concepção do que é justo.           

            Além dos princípios estabelecidos pela Constituição Federal, a Lei 9.784 de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo em nível Federal, estabelece outros princípios que devem nortear a Administração Pública, dentre os quais podemos destacar, além dos já conhecidos, os princípios da (art. 2º): finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica e interesse público.

               A Administração pode assumir duas vertentes: a primeira é a ideia de servir e executar; a segunda envolve a ideia de direção ou gestão. Nas duas visões há a presença da relação de subordinação e hierarquia. Administrar para muitos significa não só prestar serviços e executá-los, como também governar e exercer a vontade com o objetivo de obter um resultado útil a coletividade. Administrar significa também planejar e elaborar ações no sentido de enfrentar os problemas vividos diariamente pela sociedade, ou seja, elaborar Políticas Públicas que possam orientar as ações governamentais. Em suma podemos definir Administração Pública como toda atividade do Estado. Logo, podemos formular conceito próprio partindo da visão de Hely Lopes Meirelles: “O estudo da Administração Pública em geral, compreendendo a sua estrutura e as suas atividades, deve partir do conceito de Estado, sobre o qual repousa toda a concepção moderna de organização e funcionamento dos serviços públicos a serem prestados aos administrados” (MEIRELLES, 1994, p.55).

            A organização da administração pública brasileira divide-se em administração direta e indireta.

 

ADMINISTRAÇÃO DIRETA

Administração direta é o conjunto de órgãos que integram as pessoas federativas, aos quais foi atribuída a competência para o exercício, de forma centralizada, das atividades administrativas. Abrangendo três poderes políticos estruturais: Poder ExecutivoPoder Legislativo e o Poder Judiciário.

ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

A administração indireta do Estado é o conjunto de pessoas administrativas que, vinculadas à administração direta, têm o objetivo de desempenhar as atividades administrativas de forma descentralizada. A Administração Indireta, na análise de Hely Lopes Meirelles, é o conjunto dos entes (entidades com personalidade jurídica) que vinculados a um órgão da Administração Direta, prestam serviço público ou de interesse público. Segundo o art. 4º, inciso II, do Decreto-Lei n. 200/67, a Administração Indireta compõe-se das: Autarquia, Empresa Pública, Sociedade de economia mista, Fundação Pública.

Modelos de Administração Pública

            A administração no Brasil aconteceu de diferentes formas, sendo a primeira na época do Império, onde podemos observar uma administração pública patrimonialista, tendo o patrimônio do soberano se confundindo com do Estado. Esta fase é marcada pelo nepotismo e grande corrupção no serviço público, indo até a Constituição de 1934. Na Era Vargas, temos a segunda forma conhecida como administração pública burocrática, com a finalidade combater a corrupção e o nepotismo, orientando-se pelos princípios da profissionalização, da ideia de carreira, da hierarquia funcional, da impessoalidade e do formalismo. Atualmente, há uma transição para a administração pública gerencial, a qual busca a otimização e expansão dos serviços públicos, visando a redução dos custos e o aumento da efetividade e eficiência dos serviços prestados aos cidadãos. Nos dias atuais fala-se ainda de um modelo de administração pública social, ou gestão social, como podemos observar no quadro abaixo:

            O sociólogo alemão Max Weber nos oferece grandes contribuições para pensar a Administração Pública, principalmente no que diz respeito ao entendimento dos modelos patrimonial e burocrático da Administração Pública. Analisando o modelo patrimonial sob a ótica weberiana, Campante (2003 apud OLIVEIRA, 2013, p. 18) pondera que:

O patrimonialismo caracterizava-se pelo caráter personalista do poder, pela lógica subjetiva e casuística do sistema jurídico, pela irracionalidade fiscal e pela tendência à corrupção do quadro administrativo. Em sua formação mais descentralizada – a organização feudal –, a dominação patrimonial deu vida a uma estrutura social antagônica ao poder absoluto do soberano

            Nesse contexto, o adjetivo “patrimonial” designa um tipo de dominação tradicional, caracterizada pela cessão de terras que permitia a manutenção do poder político sobre amplos territórios. Patrimonialismo designa ainda uma tipo de fundamentação do poder político através do poder arbitrário e pessoal do governante e legitimado pela tradição.

            Campante (2003, p. 153) destaca sobre este tema a obra de Raymundo Faoro (1998) que procura explicar as mazelas do Estado brasileiro a partir da estrutura de poder patrimonialista do Estado português que se organizou desde a Independência do Brasil, no Brasil Império e Republicano. Dá-se então um controle patrimonialista do Estado, centralizador, e administrado em prol de uma específica camada política e social. “Em uma sociedade patrimonialista, em que o particularismo e o poder pessoal reinam, o favoritismo é o meio por excelência de ascensão social” (CAMPANTE, 2003, p. 154-155). E no caso do patronato político brasileiro, o patrimonialismo designa os donos do poder (FAORO, 1998).

            Diferente do modelo patrimonial onde a conduta é arbitrária e a ação estatal desprovida de qualquer previsibilidade, o modelo burocrático é ordenado por leis ou regulamentos administrativos, instituídos por autoridades ou organizações, cujas regras determinam o funcionamento do corpo administrativo, a partir de uma hierarquia de cargos que ordena sistemas de mando e subordinação. Com o tempo o modelo burocrático também foi revelando suas limitações como por exemplo a morosidade e o formalismo do processo burocrático e, de acordo com Oliveira (2013, p. 22): “O desgaste do modelo burocrático, principalmente na segunda metade do século XX, inspirou esforços intelectuais e experiências práticas destinadas a consolidar um novo marco na gestão estatal, conhecido como modelo gerencial de administração pública” (APG). Nessa perspectiva, o modelo empresarial serve como exemplo a ser seguido em busca de mais eficiência, com foco em resultados, metas de desempenhos e orientado para o “cidadão-consumidor”. “O foco no cidadão-consumidor buscou direcionar a atenção dos provedores de serviços públicos para as necessidades dos beneficiários, em detrimento dos interesses da própria burocracia” (OLIVEIRA, 2013, p. 24). Ferreira (2013, p. 39) pondera como a APG se baseia em um modelo de gestão de maior racionalidade gerencial e “um conjunto de medidas direcionadas para o aumento da eficiência e a elevação da produtividade das organizações estatais, valendo-se, para tanto, de mecanismos e técnicas já consagrados na gestão empresarial”.

            O foco no cidadão como proposta do APG é ressaltada por Matias-Pereira (2008 apud FERREIRA, 2013, p. 44) e dentre suas características destaca: maior agilidade e velocidade na resposta que deve ser oferecida ao cidadão pelo prestador de serviços; busca da excelência no atendimento e o estabelecimento de padrões e metas de qualidade; canais de comunicação com o usuário; e avaliação da qualidade dos serviços prestados por parte dos cidadãos.

            As críticas ao modelo de APG logo se fizeram surgir. Matias-Pereira (2008 apud FERRERIA, 2013, p. 49) “parte das suposições que não consegue comprovar, como o pressuposto de que a gestão empresarial é inerentemente superior à gestão pública”. Ferlie, et. al., (1999 apud FERRERIA, 2013, p. 49) destaca, por sua vez, que o ponto de vista competitivo dos mercados é incompatível com o coletivismo e o planejamento dos serviços públicos.

            Há ainda o fato de que os cidadãos não podem ser reduzidos a meros consumidores. Considerar o cidadão como um mero consumidor de políticas públicas revelou suas limitações e o modelo de APG foi substituído por uma outra visão que incluísse o cidadão como parte do processo de formulação de políticas públicas, através de movimentos sociais e populares e a partir de um modelo de gestão participativa, promovendo o engajamento popular e controle social. Esse modelo é o que se convencionou chamar de modelo societal da administração pública, que apresenta, de acordo com Oliveira (2013, p. 27) quatro eixos: “uma visão alternativa do desenvolvimento, a concepção participativa e deliberativa de democracia associada à noção de gestão social, o processo de reinvenção político-institucional e o novo perfil do gestor público”. Oliveira (2013, p. 28-29) ressalta em relação ao modelo de democracia deliberativa novos arranjos institucionais a partir dos Conselhos Gestores de Políticas Públicas (ver mais em Controle Social), que são órgãos vinculados à estrutura administrativa do Estado, compostos por representantes da sociedade civil e do governo, e também os modelos de orçamento participativo e fóruns temáticos.

 

Referências Bibliográficas

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 48. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015.

____. Presidência da República. Casa Civil. Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Acesso em 17/04/2017.

BRESSER PEREIRA, L. C. Estado, aparelho do Estado e sociedade civil. Brasília: ENAP, 1995.

CAMPANTE, R. G. O patrimonialismo em Faoro e Weber e a sociologia brasileira. DadosRevista de Ciências Sociais, v. 46, n. 1, p. 153-193, 2003. Acesso em 14/04/2017.

FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder – Formação do Patronato Político Brasileiro. 13. ed. São Paulo, Globo, 1998.

FERLIE, Ewan; ASBURNER, Lynn; FITZGERALD, Louise; PETTIGREW, Andrew. A nova administração pública em ação. Brasília: Ed. UNB; ENAO, 1999.

FERREIRA, Victor Cláudio P. Administração Pública Gerencial. In: SANABIO, Marcus T.; SANTOS, Gilmar J. dos; DAVID, Marcus V. Administração Pública Contemporânea: política, democracia e gestão. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2013, p. 35-56.

MADEIRA, José Maria P. Administração Pública: Tomo I. 12. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2014.

MATIAS-PEREIRA, José. Curso de administração pública: foco nas instituições e ações governamentais. São Paulo: Atlas, 2008.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19. ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores, 1990.

OLIVEIRA, Virgílio C. da Silva. Modelos de Administração Pública. In: SANABIO, Marcus T.; SANTOS, Gilmar J. dos; DAVID, Marcus V. Administração Pública Contemporânea: política, democracia e gestão. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2013, p. 9-34.

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