Yoga

 

por Alexsandro M. Medeiros

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postado em mar. 2016

atualizado em jul. 2020

            O Yoga pode ser definido como uma filosofia oriental associada à práticas meditativas tanto do Budismo quanto do Hinduísmo. A palavra Yoga é de origem sânscrita e pode ser traduzida por: união, no sentido de integração (LIMA, 2010, p. 102). Etimologicamente a palavra yoga deriva da raiz sânscrita yuj que quer dizer “conjugar, juntar, jungir” (FEURSTEIN, 2006, p. 39). O Yoga conduz a união entre o Corpo-Mente-Alma e entre a alma e Deus. “Yoga é o caminho e o caminhar que conduz a Deus. Yoga ensina como as pessoas podem viver para Deus com Deus e em Deus [...]” (TEOTIA; TEOTIA, 2000, p. 15 – grifos no original).

Alguns textos em sânscrito utilizam o termo yoga de diversas maneiras. Na Upanisad Maitrayani a palavra yoga refere-se à realização do Supremo Si Mesmo. Nos textos Tattava-Vaisharadi e Amrita-Nada-Bindu-Upanisad, a palavra yoga é utilizada como o estado de samadhi (êxtase), como também é utilizado por Vyasa no Yoga Bhashya, seu comentário sobre os Yogasutra, implicando que Yoga é “junção”, que implica na contenção da atenção. No Mahabharata, Yoga é definido como pravritti (atividade, movimento contínuo). No Bhagavad Gita o Yoga é definido como “a perícia na ação” e também como “igualdade”, “equilíbrio”, “harmonia”. Vyasa no Yoga Bhashya, em seu comentário sobre os Yogasutra, define Yoga como êxtase (FEUERSTEIN, 1998) (apud OLIVEIRA, 2015, p. 37-38).

            Em termos filosóficos e religiosos (embora Yoga não seja uma religião), yoga representa uma experiência de união do ser individual (atman) com o ser universal (Brahman). Como afirma Yogananda (2015, p. 131): “Yoga é a ciência universal da união divina da alma com o Espírito, do homem com seu Criador”. Para alcançar esta união com o Criador o praticante precisa promover, primeiramente, a união entre o corpo, a mente e o espírito.

            O objetivo do Yoga é harmonizar o corpo com a mente e a respiração, através de técnicas de respiração (pranayamas), posturas de yoga (ásanas) e da meditação.

 

(Selo de Pasupapti. SIEGEL, 2010, p. 11).

 

 

            A origem do yoga remonta, ao que se sabe, ao período de 2300 a 1750 a.C. (FEUERSTEIN, 2006). É desse período o achado arqueológico que sugere “possíveis vestígios da prática da meditação” a partir da descoberta de um “selo de estearita, descoberto em escavações arqueológicas na Índia, realizadas entre 1921 e 1931 nas ruínas de Moenjodaro e Harappa, pela equipe de John Marshall” (SIEGEL, 2010, p. 11). A imagem ilustra um ser humano em posição de meditação, sobre um trono e cercado pelas figuras de quatro animais.

            Feuerstein (2006) e Gharote (2000) estabelecem a seguinte divisão ao se referir ao Yoga:

1. Pré-Védico ou Proto-Yoga – período: 3.000 a.C. a 1.500 a.C.;

2. Yoga Pré-Clássico ou Período Védico – período: 800 a.C. a 200 a.C.;

3. Yoga Épico – período: 500 a.C. a 200 a.C.;

4. Yoga Clássico ou Período dos sutras – período: séculos II ao III a.C.;

5. Yoga Pós-Clássico ou Período Smrti – período: 200 a.C. a 1.900 d.C.;

6. Yoga Medieval – período: séculos VII ao XVII;

7. Yoga Moderno – período: séculos XVII ao XXI (apud OLIVEIRA, 2015, p. 21).

            O Yoga Pré-Clássico compreende a era Védica até o tratado yoguico escrito por Patañjali por volta do século II a.C. Esse período é assim chamado porque está situado no período em que foram escritos os Vedas, os textos mais antigos da tradição hindu: um vasto corpo de poesia sânscrita, diálogos filosóficos e mitos, considerados pelos hindus como a fonte primeira de todo o conhecimento e fundamento sagrado do Hinduísmo. A mais antiga literatura de uma longa tradição oral que existiu bem antes de ser sistematizada como a base do extenso sistema de escrituras sagradas do Hinduísmo. Há muitas dúvidas sobre a época em que os Vedas foram escritos. Provavelmente por volta de 1500 a.C. ou 2000  a.C.

            Referências ao Yoga se encontram, por exemplo, no Rgveda (um dos textos dos Vedas). Todavia o que se encontra nos Vedas são “rudimentos do Yoga clássico; em compensação, esses velhos textos se apoiam em disciplinas ascéticas e ideológicas “extáticas” que, sem terem sempre relações diretas com o Yoga propriamente dito, acabaram por serem integrados na tradição yóguica” (ELIADE, 1996, p. 95 apud OLIVEIRA, 2015, p. 22).

            Do período Épico temos os textos que fazem referências claras e sistematizas às práticas do Yoga. Esse período pode ser chamado de épico porque dele fazem parte as duas grandes epopeias: Ramayana e Mahabharata. O Bhagavad Gītā, que veremos em mais detalhes a seguir, faz parte do Mahabharata.

            O Yoga Clássico é marcado pelos aforismos de Patañjali, que compilou uma coletânea de 196 aforismos conhecidos como Yoga-Sutras. “Sobre Patanjali sabe-se muito pouco, e o pouco que se sabe é lendário e cheio de contradições. Patanjali não é o criador do Yoga e de suas técnicas, ele foi responsável pela compilação, e pela correção das tradições doutrinárias e técnicas do Yoga” (OLIVEIRA, 2015, p. 24). Há controvérsias quanto a data de publicação dos YogaSutras: possivelmente século II a.C. “Os historiadores supõem que ele [Patañjali] tenha sido uma grande autoridade em Yoga, chefe de uma escola de estudos e práticas. O texto Yogasutra é considerado o ápice de um longo período de desenvolvimento das técnicas do Yoga” (STORNI, 2013, p. 32).

            O Yoga Pós-Clássico destaca-se pela composição dos textos: Smrti, Purana. O primeiro é formado pelo dhamasutra, que são ensinamentos de santos e sábios além de livros jurídicos; e pelo grhyasutra, obras que tratam de cerimônias domésticas e sacrifícios menores. Já os Puranas são compêndios antológicos sobre mitos cosmogônicos, lendas antigas, temas religiosos e filosóficos.

          O Yoga Medieval destaca-se pela vasta literatura de Tantras que influenciaram “as tradições hinduístas, budistas e jainista, e também influenciou o Yoga, o que fez surgir o Hatha Yoga, que é a forma mais popular de Yoga, muito popular ainda hoje, principalmente por conta dos asanas (posturas)” (OLIVEIRA, 2015, p. 28).

            E finalmente o Yoga Moderno, que passou a existir “oficialmente com o discurso de Swami Vivekananda [discípulo de Shri Ramakrishna], no primeiro Parlamento Mundial das Religiões (1893) (SIMÕES, 2011, p. 30)”. Oliveira (2015, 32-34) destaca deste período os estudos sobre o aspecto científico do yoga, a partir da década de 1920 com o Swami Kuvalaynanda, no centro de Kaivalyadhama.

          A participação de Swami Vivekanda no Parlamento Mundial das Religiões constitui também um marco importante da chegada do Yoga no ocidente. Outro marco no ocidente aconteceu em 1933, em Bucareste, com a defesa da primeira tese de doutorado sobre yoga por Mircea Eliade e que foi publicada posteriormente como livro:

intitulado ‘Yoga, Imortalidade e Liberdade’. Sua obra consta de oito capítulos, sendo que, no primeiro, parte da dor da existência, pergunta se a liberação é possível e descreve, nos capítulos subsequentes, as técnicas, a filosofia, a simbologia e o yoga relacionado ao bramanismo, hinduísmo, budismo, tantrismo, à alquimia e aos aborígenes indianos (SIEGEL, 2010, p. 27).

Disponível em: Blog Superprof. Acesso em: abr. 2019.

 

Obras

              Diversos textos hindus tratam do yoga como: os Vedas, Upanixades, o Mahabharata, o Bhagavad Gītā (que faz parte do Mahabharata), o Yoga Sutra, o Hatha Yoga Pradipika, o Shiva Samhita e diversos Tantras.

 

O Bhagavad Gītā

            O Bhagavad Gītā (em sânscrito: भगवद्गीता), ou a Canção Divina, é composto por dezoito sucintos capítulos e como vimos, faz parte da era épica: “Dos textos religiosos védicos [...] é o mais conhecido e o mais frequentemente traduzido” (Prof. Edward C. Dimock Jr., apud O BHAGAVAD GĪTĀ, 1976, p. IX).

          O Bhagavad Gītā é chamado de a Canção Divina por conter as palavras da divindade encarnada Krishna que, através de um diálogo com Arjuna, procura ensinar os homens a elevar-se acima da consciência mundana, até uma consciência divina superior. Krishna (considerado como a suprema personalidade de Deus) guia o jovem guerreiro Arjuna pelos caminhos do karma yoga (yoga da ação), jnana yoga (yoga do conhecimento) e bhakti yoga (yoga da devoção).

            O Baghavad-Gītā retrata

o momento antes do combate entre dois grandes exércitos, e mostra os conflitos internos de Arjuna, que pede ao seu cocheiro para passar por entre as tropas de ambos os exércitos para avaliar seu poderio e de seu inimigo, mas no momento em que Arjuna avista nos dois lados do campo de batalha, seus amigos, mestres, filhos, avós, sobrinhos, tios e irmãos; Arjuna é acometido por uma grande emoção, que o leva a dúvida se deveria iniciar a batalha ou desistir. O que vem a seguir no texto é o diálogo entre Arjuna e seu cocheiro, que é Krsna, encarnação do deus Vishnu.

           Arjuna representa o papel da alma confusa sobre seu dever e recebe iluminação diretamente do Senhor Krishna. Arjuna está confuso: “deveria ele lutar contra e matar seus amigos e parentes?” (Prof. Edward C. Dimock Jr., apud O BHAGAVAD GĪTĀ, 1976, p. IX).

            No desenrolar do diálogo são colocados pontos importantes da filosofia do yoga. “No Baghavad-Gita são encontrados vários termos relacionados ao Yoga, como dharana, dhyana e samadhi” (OLIVEIRA, 2015, p. 22).

 

Lord Krishna instructing the Bhagavad Gita to Arjuna in Kurukshetra

(Krishna instrui o Bhagavad Gita para Arjuna em Kurukshetra)

Por His Holiness Bhaktiratna Sadhu Swami Gaurangapada - originally posted to Flickr as Lord Parthasarthi, CC BY 2.0

 

Yoga é um dos seis sistemas ortodoxos da filosofia Indiana. Segundo Sai Baba, 5.142 anos atrás, o Senhor Krishna falou O Bhagvada Gita a Seu amigo e devoto Arjuna sobre Karma-Yoga, Dhyana-Yoga e Bhakti-Yoga. Krishna disse: “Ensinei esta imperecível ciência da Yoga ao Deus Sol, Vivasvana, e Vivasvana ensinou-a a Manu, o pai da humanidade e Manu, por sua vez, ensinou a Ikshavaku. Sobre Dhyana Yoga Krishna disse: “Aquele que é regulado em seus hábitos de comer, dormir, divertir-se e trabalhar pode mitigar todas as dores materiais, praticando o sistema de Yoga [...] o Senhor Krishna explica sobre Karma-Yoga (Yoga por Ação). Ele falou: [...] Aquele que executa seu dever sem apego, entregando os resultados ao Senhor Supremo, não é afetado pela ação pecaminosa, assim como a folha de Lótus não é tocada pela água [...] Sobre a Bhakti-Yoga, a Suprema Personalidade de Deus (Krishna) disse: “Aqueles que fixam suas mentes em Minha forma pessoal e sempre se ocupam em adorar-Me com grande fé transcendental, Eu os considero perfeitos. Fixa tua mente em mim, a Suprema Personalidade de Deus, e ocupa toda a tua inteligência em Mim [...]” (TEOTIA; TEOTIA, 2000, p. 17-18 – grifos no original).

            O Bhagavad Gītā faz parte do épico do Mahabharata. Sua inserção neste épico é datado provavelmente do séc. IV a. C., mais recente que o restante do livro.

            O Bhagavad Gītā é a essência do conhecimento védico e um clássico de filosofia e espiritualidade. “O Bhagvada Gita fala que ‘Aquele que se tenha desapegado dos contatos externos encontra a felicidade em Atman (Alma); tendo alcançado a união (Yoga) com Brahman (Deus) desfruta a bem-aventurança eterna’” (TEOTIA; TEOTIA, 2000, p. 16 – grifos no original).

            No Bhagavad Gītā podemos encontrar pelo menos seis significados para a palavra Yoga contidos nos ensinamentos de Krishna: “1. Equanimidade na vitória e na derrota; 2. Habilidade e eficiência na ação; 3. O supremo segredo da vida; 4. Aquilo que gera indivisível felicidade; 5. Serenidade; 6. O que extingue a dor” (TEOTIA; TEOTIA, 2000, p. 27).

 

Os YogaSutras de Patañjali

            A obra YogaSutras é um tratado clássico de filosofia yóguica de cujo autor, Patañjali, se sabe muito pouco a respeito. Um sistema filosófico cuja leitura e estudo “levam ao entendimento claro e objetivo sobre a natureza metafísica do ser humano, sobre o sentido da experiência terrena e sobre os caminhos para a libertação, enquanto indivíduos encarnados” (Fernando José Gramaccini apud OS YOGASUTRAS DE PATAÑJALI, 1999, p. 9).

            Escrita em sânscrito em forma de sutras (palavra de origem sânscrita que vem da raiz “siv” e significa “costurar”, dando a ideia de que cada frase anterior leva a um encadeamento necessário com a frase que se segue) ou aforismos (sentença breve):

Patañjali teria sido o compilador desta obra que, segundo a tradição, é o resumo e o resultado de alguns séculos de debates entre filósofos e praticantes do Yoga. Não se sabe a data precisa de sua redação original, mas o estilo Clássico da versão atual indica que esta última deve ter sido preparada durante a dinastia Gupta, entre os Séculos III e V d.C. O conteúdo, por outro lado, sugere que sua composição possa ter ocorrido antes disso, por volta do século IV a.C., quando o Budismo estava em seus primórdios (Carlos Eduardo G. Barbosa apud OS YOGASUTRAS DE PATAÑJALI, 1999, p. 13).

            Seus ensinamentos estão apoiados nos Vedas e no sistema Samkhya que é tomado como base. Foram feitos para serem memorizados pelos alunos e discípulos tratando de conceitos filosóficos “envolvidos na prática do Yoga, sem detalhar as formas assumidas por essa mesma prática. Seria um exagero, porém, considerá-lo um texto puramente teórico, pois toda a sua orientação é voltada para a viabilização mais segura dessa mesma prática” (Carlos Eduardo G. Barbosa apud OS YOGASUTRAS DE PATAÑJALI, 1999, p. 21).

            Os YogaSutras estão divididos em quatro capítulos:

Capítulo I – Samadhipada (capítulo sobre a integração) - possui 51 sutras, aborda o estado “yoguico” que permite alcançar Samadhi, descreve e define o Yoga.

Capítulo II – Sadhanapada (capítulo sobre os meios de realização) – possui 55 sutras, trata do Yoga da ação (Karma Yoga), do astangayoga (oito passos para obtenção do objetivo do Yoga – Samadhi), da filosofia de klesas e tem por objetivo responder à pergunta: “por que alguém deveria praticar Yoga?”.

Capítulo III – Vibhutipada (capítulo sobre os poderes desenvolvidos) – possui 56 sutras, trata sobre os siddhis (poderes yóguicos).

Capítulo IV – Kaivalyapada (capítulo sobre o isolamento absoluto) – possui 34 sutras, aborda sobre a libertação do ser, trata do ser transcendental e expõe os problemas filosóficos essenciais envolvidos no estudo e prática do Yoga (OLIVEIRA, 2015, p. 25).

            No primeiro capítulo, os aforismos definem o Yoga como supressão dos movimentos da consciência.

           No segundo capítulo temos a descrição dos oito passos: yama, niyamā, āsanas, prānāyāma, pratyāhāra, dhāranā, dhyanā e samādhi (STORNI, 2013, p. 33-36). O primeiro passo (yama) estabelece a ética ou disciplina que deve ser seguida pelo praticante de Yoga: “Trata-se do voto que o yougue deve fazer antes de avançar em sua prática” (STORNI, 2013, p. 34). Esse voto inclui questões como a não violência (ahimsa), a verdade (satya), o não roubar (asteya), a castidade (bhamacarya) e o não cobiçar (aparygrahayama). O segundo passo trata do auto controle (niyamā): se as cinco regras do yama servem para harmonizar o relacionamento do yogue com as outras pessoas e seres vivos, temos igualmente cinco regras do niyamā que tem como objetivo harmonizar o relacionamento do yogue com a própria vida e a realidade transcendente que são: a pureza (çauca), o contentamento (santosha), a ascese (tapas), o estudo (svadhyaye) e a devoção ao senhor (içvarapranichanani). O terceiro passo trata das posturas (āsanas): é o momento do domínio do corpo, após o domínio da vida social (yama) e pessoal (niyamā). No quarto passo o yogue deve buscar o controle do prānā (energia vital) através da respiração: constitui o passo do prānāyāma. Através desta técnica o yogue consegue “influenciar o campo bioenergético do corpo. À medida que a respiração ou força vital sobe pelo corpo, a atenção também sobe e vai produzindo experiências cada vez mais sutis, levando a concentração para os chakras (centros de energia) superiores” (STORNI, 2013, p. 35). O quinto passo é o recolhimento dos sentidos (pratyāhāra), onde o yogue deve conquistar a habilidade recolher os sentidos, ou se desligar dos estímulos exteriores. O sexto passo é a concentração (dhāranā), a fixação da mente em um “estado de imobilidade através do direcionamento da atenção para um determinado suporte que pode ser uma parte do corpo (físico ou sutil, por exemplo nariz ou chakra), um objeto externo ou uma imagem de Deus que foi interiorizada” (STORNI, 2013, p. 35-36). O sétimo passo é a meditação (dhyanā), uma consequência natural de dhāranā, cujo objetivo “é esvaziar a mente permanecendo no estado de alerta. Assim, a meditação é a interrupção do fluxo de atividade mental ordinária (vritti) – os redemoinhos da mente” (STORNI, 2013, p. 36). E finalmente o samādhi, o estado de êxtase que sobrevém após o estado de meditação, quando cessam os turbilhões e flutuações da mente.

            O terceiro capítulo trata dos poderes (siddhis) que advêm da prática do Yoga.

           Já o quarto capítulo fala sobre o isolamento absoluto: um “estado transmental de simples presença e pura consciência” (STORNI, 2013, p. 36).

            Sobre os YogaSutras merece destaque Vyasa, um poeta lendário hindu e autor do mais antigo comentário sobre a obra de Patañjali: o Yoga-Bhâshya, provavelmente escrito no século V d. C.

 

Os Diferentes Tipos de Yoga

            Não existe apenas uma corrente do Yoga ou caminhos para a realização do indivíduo. Há várias correntes dentre as quais podemos destacar: “Kriya, incluindo Hatha Yoga (Yoga da técnica), Jnana (Yoga do conhecimento), Bhakti (Yoga da devoção), Karma (Yoga do serviço) e Raja Yoga (integral, pois combina os quatro tipos precedentes)” (PEÇANHA; CAMPANA, 2010, p. 203). Hatha-Yoga é o ramo do Yoga direcionado para o domínio e controle do corpo físico. “Atualmente, o Hatha Yoga é o ramo mais praticado  no mundo por pessoas que o procuram pelos benefícios físicos, mas desconhecem seu objetivo tradicional: a autorrealização” (LIMA, 2010, p. 37).

            O termo Bhakti significa amor, Bhakti consiste no “Yoga da dedicação amorosa à Pessoa divina e da participação do amor dessa Pessoa” (FEUERSTEIN, 2006, p. 74). Bhakti-Yoga enfatiza, portanto, o desapego da personalidade egóica.

            Pamela Siegel destaca os quatro tipos clássicos que seriam: “Bhakti (devoção); Karma (serviço); Jnana (conhecimento) e Raja (real)” (2010, p. 25). Na Tese da autora (id., 2010, p. 26) consta uma imagem extraída da Revista Superinteressante que ilustra uma árvore do yoga em que a Raja-Yoga seria a raiz comum a partir da qual brotam seis ramificações que se desdobra em vários outros tipos. Já Feuerstein (2006) menciona oito tipos tradicionais: Raja, Hatha, Jnana, Bhakti, Karma, Mantra, Laya e Yoga Integral.

            No caso do Raja-Yoga (compilado dos YogaSutras de Patañjali) são oito passos que devem ser realizados para a harmonização do corpo com a mente através da respiração (pranayamas), posturas de yoga (ásanas) e da meditação. Esses oito passos estão descritos no capítulo 2 dos YogaSutras de Patañjali (OS YOGASUTRAS DE PATAÑJALI, 1999), mas também temos um quadro abaixo sobre como estes oito passos são interpretados por diferentes autores:

 

TEOTIA; TEOTIA, 2000, p. 36-38

SANTOS, 2013, p. 30

PEÇANHA; CAMPANA, 2010, p. 203

yama

abstinência, renúncia

abstinências

princípios de comportamento social

niyama

observação (cultivo da pureza do corpo e da mente)

observâncias

atitudes, comportamento individual

asanas

posturas

posturas

posturas em harmonia com a consciência

pranayama

controle e domínio da respiração

controle da respiração

controle da respiração e força vital

pratyahara

Isolamento da mente dos estímulos sensoriais

retirada dos sentidos

controle sensorial

dharana

concentração, atenção fixa

concentração

controle da mente, concentração

dhyana

meditação, fase de penetração da mente no ponto fixo em Dharana

meditação

meditação

samadhi

êxtase, unificação, integração e identificação da consciência com o objeto percebido

contemplação

absorção, tornar-se uno com o objeto percebido

 

            Esses oito componentes do Yoga também são descritos por Carlos Eduardo G. Barbosa (apud OS YOGASUTRAS DE PATAÑJALI, 1999, p. 29) da seguinte forma:

yama (normas de convivência), niyama (normas de aperfeiçoamento pessoal), asana (posturas de assentamento), pranayama (controle e direcionamento da vitalidade), pratyahara (recolhimento da atenção), dharana (concentração da atenção em um objeto determinado), dhyanam (permanência no estado de concentração) e Samadhi (absorção e elevação da consciência dentro do próprio processo de cognição).

            O último estágio, Samadhi, é o objetivo final do Yoga e corresponde a um estado de consciência que está diretamente relacionado com a experiência do sagrado. “Para Eliade (1996), Samadhi não pode ser traduzido, assim também como sua experiência é indescritível, sendo um plano de consciência inatingível dentro dos processos racionais do homem comum” (OLIVEIRA, 2015, p. 38).

            Considerando a grande ramificação do yoga no período da modernidade, Oliveira (2015, p. 34) apresenta outros tantos tipos de estilo de yoga:

Estilo

Fundador

Características

Yengar

B.K.S. Yengar

Baseado no alinhamento do corpo com intensidade e precisão. A meditação é alcançada por meio da inteligência presente no corpo físico. As posturas às vezes são mantidas por alguns minutos até uma hora e sempre adaptadas ao nível e necessidades do aluno. Faz uso extensivo de adereços para apoiar os alunos em posturas passivas e relaxantes.

Asthanga

Pattabhi Jois

Estilo vigoroso e altamente atlético, marcado por uma sequência de conjunto de posturas. Cada postura é realizada uma vez e mantida durante cinco respirações.

Viniyoga

T.K.V. Desikachar

Um sistema altamente terapêutico e geralmente suave, o que coloca em práticas e estão adaptados para o indivíduo com base nas necessidades do estudante e o diagnóstico do professor.

Bikram**

Bikram Choudry

Uma sequência de 26 posturas exigentes e dois exercícios de respiração, sempre feitos na mesma ordem e forma, em um quarto úmido aquecido a 40°C. Cada postura é repetida duas vezes, e, geralmente, realizada com duração entre 30 e 60 segundos, em uma prática padrão de 90 minutos. Bikram é conhecida por seu rigor.

Sivananda

Swami Sivananda

Uma sequência normalmente suave de 13 posturas intercaladas com períodos de relaxamento. Cada postura tem múltiplas variações adaptáveis a diversas necessidades e habilidades dos alunos. As aulas incluem regularmente a meditação, exercícios respiratórios, e cantos, ao lado de posturas tradicionais.

Integral

Swami Satchidananda

Uma abordagem suave semelhante ao Sivananda, aulas em vários níveis, cada um com poses padrão moderados, com períodos de relaxamento. Além de pranayama, canto e meditação, grande ênfase no estudo de textos de Yoga tradicional e Karma Yoga.

Kundalini

Yogi Bhajan

Uma prática energizante que combina gestos repetitivos com técnicas fortes de respiração, meditação e canto, com menos atenção a precisão anatômica. Repetições podem durar vários minutos.

Kripalu

Swami Kripalu

Uma prática versátil e adaptável que incorpora a percepção da respiração e autoestudo com posturas. As práticas são modificadas segundo as metas e necessidades do indivíduo, e são ministradas em três etapas: primeiro desenvolver a consciência e atenção ao alinhamento do corpo físico, em seguida, realização de posturas para desafiar o corpo e a mente, e, finalmente, uma meditação em movimento.


** Um documentário produzido pela Netflix revela uma outra face de Bikram: além de iogue e guru, Bikram foi acusado de abusar sexualmente de suas alunas, inclusive com casos de estupro. Bikram Choudhury conquistou Los Angeles nos anos 1970 e foi considerado um dos mais famosos iogues do mundo, com mais de 1.500 estúdios com o seu nome em diversos países. Desde 2017, no entanto, o indiano é considerado fugitivo nos Estados Unidos, como retrata o documentário intitulado: “Bikram: Yogi, Guru, Predador”.

 

            O yoga é uma filosofia ou uma visão de mundo que visa a preparação “para a realização de um melhor conhecimento de si mesmo, um aprimoramento do ser, assim como para o desenvolvimento de qualidades e potencialidades tais como: concentração, energia, domínio de si mesmo, alegria, sensatez, sensação de profunda paz e unidade” (LEITE, 1999, p. 3): "é uma prática mente-corpo, que abrange técnicas fisiológicas e psíquicas, e visa chegar ao estado de identificação do ser com a sua essência, através da ausência de flutuações mentais” (SIEGEL, 2010, p. 28). Lima (2010, p. 33) destaca que o praticante de Yoga é levado “a treinar constantemente a percepção – audição, visão, olfato, sensibilidade da pele, relaxamento – e treina a mente de modo que melhora o senso de discernimento, levando a pessoa a planejar melhor seus objetivos”. E Leite (1999, p. 3) ressalta ainda como a prática do Yoga é importante para o controle e regularização da respiração, através de exercícios rítmicos, uniformes, regulares e podem ser praticados em pé, sentado ou deitado, em posturas estáticas ou através de movimentos corporais dinâmicos.

            O yoga não deve ser visto apenas como uma prática física ou de posturas corporais e exercícios respiratórios, mas seu objetivo é a busca de uma vivência com o sagrado: “La fuerza propuesta por el Hatha Yoga, no es la de un atleta, sino la de un mago, la de un hombre dios” (ELIADE, 1961, p. 170 apud PULIDO, 2009, p. 37). Além do mais “[...] en la práctica del yoga y la meditación se busca un auténtico entrenamiento para obtener una visión de si mismo que genere un mayor nivel de control sobre las emociones y acciones” (PULIDO, 2009, p. 37). Embora um dos objetivos do Yoga seja a vivência com o sagrado o Yoga não é uma religião e qualquer pessoa, de qualquer credo religioso ou mesmo sem credo algum pode praticar yoga. Todavia, embora o Yoga não seja considerado uma religião, não se pode negar que “no seu entendimento mais profundo, o Yoga pode assemelhar-se a conceitos como religião e espiritualidade” (SIMÕES, 2011, p. 21).

[...] pensar no Yoga alheio ao seu caráter religioso popular e devocional a Deus, aos deuses e às divindades, através de uma prática incorporada é fechar os olhos à sua própria trajetória histórica, e considerá-lo, de certo modo, como uma série de simples técnicas físicas ou um tipo oriental de condicionamento físico, tudo o que os yogues modernos tradicionais mais condenam (SIMÕES, 2011, p. 21).

            A ritualidade da prática do yoga é feita em um ambiente e espaço-tempo “sagrado”, a fim de que cada praticante possa reintegrar-se a si mesmo para encontrar a verdade que cada um possui dentro de si: a prática do yoga proporciona uma experiência espiritual materializada no corpo individual. Com efeito, “O Yoga tem um caráter multidisciplinar que envolve aspectos metafísicos, ontológicos e teológicos, bem como aspectos psicológicos, físicos e práticos” (PEÇANHA; CAMPANA, 2010, p. 204), embora, no Ocidente, “[...] o Yoga vem caracterizando-se como um sistema de práticas, sobretudo de posturas psicofísicas (asanas) visando à obtenção de saúde e administração do estresse” (GHAROTE, 2000 apud PEÇANHA; CAMPANA, 2010, p. 204).


Referências Bibliográficas

FEUERSTEIN, G. A tradição do Yoga: história, literatura, filosofia e prática. 5. ed. São Paulo: Pensamento, 2006.

GHAROTE, M. L. Técnicas de Yoga. Tradução de Danilo F. Santaella. Guarulhos: Phorte, 2000.

LEITE, Marta R. Ricoy. Estudo dos padrões do movimento respiratório e do comportamento cardiovascular em mulheres idosas praticantes de yoga. Tese [Doutorado em Educação Física]. Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 1999. Acessado em 15/02/2016.

LIMA, Vânia C. L. O Yoga como caminho de elevação na espiritualidade e na saúde. Dissertação (Mestrado em Ciências das Religiões). Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões. Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, 2010.

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Sabedoria Oriental

O site francês Ciência e Futuro destaca os benefício do Yoga como uma prática terapêutica

Le yoga, une nouvelle thérapie ?

 

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Referência Bibliográfica

TEOTIA, Harendra S.; TEOTIA, Rita. Yoga e Saúde. Dieta, relaxamento, respiração, posturas, meditação & estresse. Campina Grande-PB: Oriental Yoga Center, 2000.