A DIFÍCIL VIDA DE ESCRITOR

22/11/2023 18:37

        Nos últimos dias, tenho refletido na questão do fracasso e do sucesso em atividades realizadas nas nossas vidas. Ainda hoje, vi a atleta Rebeca Andrade, num canal de TV, afirmar que a vitória passa também pelo fracasso.

        Tanto isso é verdade que meu amigo Joteli, de 71 anos, ficou em terceiro lugar, em sua faixa etária, numa competição matinal de tênis de mesa há poucos dias. Porém, no mesmo dia, à tarde, foi desclassificado noutra competição, quando perdeu para uma menina de cerca de 10 anos e para um jovem de 30...

        O detalhe é que esses já treinam há alguns anos, e aquele há alguns meses. Por isso, o “velhinho” não desiste do esporte que, em sua idade, segundo informação do diretor de tênis de mesa do clube, auxilia na prevenção e combate ao Alzheimer.

        Meu amigo ficou muito entusiasmado com as duas vitórias matutinas, que lhe deram o terceiro lugar dentre quatro competidores. Por isso, nem ligou para as duas derrotas vespertinas. Já se inscreveu para novo desafio, no próximo sábado, noutro clube de Brasília.

        Como se diz no Japão: “O importante é competir”. Mas que nosso maior adversário sejamos nós mesmos e tenhamos todo o respeito ao oponente. Para sair-se vitorioso, em qualquer torneio, além do talento, é preciso muito treino.

        E nas letras, como se dá o sucesso? Machado de Assis recomendava aos jovens que jamais fossem açodados na difusão a outrem daquilo que escreviam. A pressa não nos assegura bons textos, afirmava o Bruxo do Cosme Velho. Daí a necessidade de ler muito sobre um assunto, antes de escrever sobre ele e, na produção textual, ler, reler, cortar, acrescer, inovar quanto puder e, se possível, contar com um bom revisor, como o que eu tenho: o amigo Astolfo.

        Inda hoje li interessante frase dum bloguista. Ele afirmou ter ouvido dizer que somente após sua morte os escritores ganham fama na publicação de seus livros. Será verdade? Nem sempre. Entretanto, alguns escritores só ganharam fama post mortem. Exemplos:

        Anne Frank, jovem judia, escreveu a famosa obra intitulada O Diário de Anne Frank, que só foi conhecida no mundo após sua morte num campo de concentração. Seu relato foi escrito entre 1942 e 1944, quando estava escondida dos alemães nos fundos dum prédio, em Amsterdã, na Holanda. Ela morreu de tifo e inanição no campo de concentração nazista dessa cidade. Consta que a obra, antes de ser publicada, foi rejeitada por 15 editoras. Depois de publicada, foi traduzida em mais de 70 idiomas e vendeu mais de 35 milhões de livros.

        Emily Dickinson, poetisa americana do século XIX, embora tenha escrito milhares de poemas, em vida, somente doze haviam sido publicados. É considerada uma das mais destacadas poetisas dos Estados Unidos. Além da influência bíblica, Shakespeare a influenciou...

        Franz Kafka, também escritor judeu, é considerado um dos grandes pensadores do século vinte. Entregou sua obra literária, antes de morrer, ao amigo Max Brod, ao qual pediu que a destruísse, mas Brod publicou-a sob o título de Metamorfose, que imortalizou Kafka como grande escritor.

        Lima Barreto, um dos romancistas mais conhecidos hoje, no meio escolar e acadêmico, sofreu rejeição em vida e mal pôde pagar para publicar sua obra enquanto viveu.

        Tudo isso vem à baila no momento em que meu amigo Joteli, o mesatenista citado, que pouco faz questão de divulgar suas obras literárias, constata quão difícil é o reconhecimento popular de seu trabalho. Após ter escrito cerca de 600 crônicas, resolveu publicar 60, dez por cento delas, a convite de uma editora acadêmica. Para tal, fez algumas modificações e classificações temáticas, melhorou o que já havia sido aprovado, mudou algo e publicou o livro, depois de pagar por sua edição.

        Dois meses depois de publicada, conferiu a venda de sua obra, em aplicativo fornecido pela editora, que não comercializa o livro em livrarias e só imprime o que lhe é pedido: três livros seus foram vendidos: um comprado por um amigo e dois por uma filha.

        Força, meu amigo. Quem sabe se, após sua desencarnação, sua obra não seja reconhecida? Enquanto isso não ocorre, continue praticando tênis de mesa...

 

 

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Sobre o Autor

Jorge Leite de Oliveira é

Consultor Legislativo aposentado da CLDF. Formação acadêmica: Bacharel em Direito (Advogado, OAB/DF 16922); grad. em Letras (UniCEUB); pós-grad. em Língua Portuguesa(CESAPE/DF) e em Literatura Brasileira (UnB); Mestre em Literatura e Doutor em Literatura pela UnB. Professor de Língua Portuguesa, Redação, Orientação de Monografia, Literatura e Pesquisas, no UniCEUB, de 1º set. 1988 a 1º jul. 2010. Palestrante, escritor, revisor e articulista espírita. Autor do Blog: <jojorgeleite.blogspot.com/>.

Autor dos livros:

1. Texto acadêmico: técnicas de redação e de pesquisa científica. 10. ed. 1. reimp. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019.

2. Guia prático de leitura e escrita. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

3. Chamados de Assis: espaços fantásticos do Rio mutante na obra machadiana. Curitiba, PR, 2018.

4. Da época de estudante de Letras: edição esgotada: Mirante: poesias. Brasília: Ed. do autor, 1984.

5. Texto técnico: guia de pesquisa e de redação. 3. ed. rev., ampl. e melhorada. Brasília: abcBSB, 2004 (também esgotada).

 

Contato:

jojorgeleite@gmail.com