As Formas de Governo

por Alexsandro M. Medeiros

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postado em 2014

             Os critérios utilizados para se determinar as diferentes formas de Governo são, principalmente, o do número de titulares do poder soberano (critério utilizado desde Aristóteles na antiguidade) e o da separação de poderes (apoiado na teoria de Montesquieu), entre outros.

            Aristóteles dividiu as formas de Governo quanto ao seu número em: monarquia (o governo de um só), aristocracia (o governo de alguns e, mais especificamente, o governo dos melhores) e a república (o governo daqueles considerados cidadãos). Aristóteles procedeu ainda a distinção entre as formas de governo justas (o governante ou os governantes exercem o poder tendo em vista invariavelmente o bem comum) e injustas (o governante ou os governantes exercem o poder tendo em vista unicamente seus próprios interesses). Para cada forma de governo anteriormente mencionada, que o filósofo considera como uma forma pura de governo, existe uma forma degenerada, injusta e impura, são elas: a tirania, oligarquia e demagogia, respectivamente.

            A esta classificação de Aristóteles, o filósofo romano Cícero acrescentou uma quarta forma de governo: as formas mistas de governo. Neste caso, às três formas de governo mencionadas por Aristóteles, Cícero acrescenta a ideia de que elas podem aparecer simultaneamente numa mesma sociedade. Essa forma, segundo Cícero, já existia no Estado romano e um exemplo contemporâneo seria o da Inglaterra, em que mesclam-se a figura do rei(rainha) com o Parlamento.

            Para o filósofo italiano Maquiavel, os Estados são, ou Repúblicas (abrangendo a aristocracia e a democracia) ou Principados. Já o filósofo Montesquieu estabeleceu em sua obra Espírito das Leis a divisão das formas de governo em república (seguindo Maquiavel, compreende esta a aristocracia e a democracia, ou seja, o povo em seu conjunto, ou apenas parte do povo, possui o poder soberano), monarquia e despotismo. Na monarquia, um só governa, mas através de leis fixas e estabelecidas, enquanto que por despotismo, Montesquieu entende, em certo sentido, uma forma degenerada de governo, como em Aristóteles. O despotismo é uma transgressão da lei em que o monarca reina fora da ordem jurídica, sob o impulso de seus caprichos pessoais. Um só governa, sem lei e sem regra.          

Disponível no blog: MEMORIZANDO DIREITO (Acessado em 02/12/2015)

            No caso do filósofo francês Jean-Jacques Rousseau, as formas de governo são legítimas à medida em que o povo é o instituído como soberano e o monarca ou governo apenas o executor da vontade soberana (no caso, do povo) e isso pode ocorrer em qualquer uma das formas de governo: monarquia, aristocracia ou democracia. O que o filósofo francês traz de novidade em relação as formas de governo até aqui já esboçadas é a distinção que faz entre os tipos de Aristocracia, considerando o tipo hereditário como o pior dos governos e a eletiva a que melhor convém, desde que governo em proveito da multidão (o que, nesse caso, não difere do modelo aristotélico do governo justo enquanto aquele que é administrado visando o bem comum. Como pondera Chevalier (1999, p. 183):

Aristocracia: é o governo confiado a uma minoria. Pode ser natural (nas primitivas sociedades, em que os chefes de família deliberavam entre si a respeito dos negócios públicos), eletiva ou hereditária. O hereditário é o pior dos governos. O eleito é o melhor: “A ordem melhor e a mais natural é que os mais sábios governem a multidão, quando se tem a certeza de que a governarão em proveito dela e não, seu; não se deve multiplicar inutilmente as engrenagens, nem fazer com vinte mil homens o que cem homens escolhidos podem fazer melhor ainda” (CHEVALIER, 1999, p. 183).

            O filósofo alemão Immanuel Kant (1998), em seu opúsculo sobre A paz perpétua estabelece a seguinte divisão das formas de um Estado: a) pela diferença de pessoas que possuem o poder supremo (autocracia, aristocracia e democracia; poder do príncipe, da nobreza, do povo); b) pelo modo de governar o povo: republicana e despótica (seguindo Montesquieu); sendo a republicana caracterizada pela divisão entre poder executivo e legislativo e a despótica, pela execução arbitrária do chefe de Estado de leis que ele próprio fez, com o que a vontade pública é manejada pelo governante como sua vontade particular. O republicanismo e despotismo são duas formas contrárias de governo, diferenciadas entre si pelo modo distinto de utilização do poder do Estado. Em seu opúsculo, Kant defende uma forma republicana de governo e constituição baseada em princípios como: a liberdade dos membros da sociedade; a dependência de todos com respeito a uma única legislação comum; a igualdade de todos os cidadãos. Contudo, afirma o filósofo que, embora a constituição republicana seja a única perfeitamente adequada ao direito dos homens, é a mais difícil de estabelecer e de se conservar devido as tendências egoístas dos seres humanos.

            Quanto ao critério da separação de poderes, contemporaneamente convencionou-se separar os tipos de Governos em: governo parlamentar, governo presidencial e governo convencional ou de assembleia. O governo parlamentar se baseia fundamentalmente na igualdade e colaboração entre o poder executivo e legislativo. O governo presidencial resulta num sistema de separação rígida entre os três poderes, enquanto que o governo convencional faz prevalecer a assembleia representativa, em matéria de governo, daí “governo de assembleia”. Por ser os dois tipos de Governos mais atuais nos diferentes países do mundo ocidental, vamos nos deter um pouco mais e entender um pouco melhor como funcionam o presidencialismo e o parlamentarismo. É preciso salientar, contudo, que tanto o presidencialismo quanto o parlamentarismo não chegam a representar formas de Estado, mas são um processo da democracia representativa que determina atribuições e fixam as relações dos poderes entre si, são formas de exercício do poder.

            O presidencialismo não se explica unicamente pela existência de um Presidente assim como o Parlamentarismo não se explica unicamente pela existência do Parlamento. Os Estados presidencialistas ostentam um Parlamento que em geral se chama Congresso e os Estados parlamentaristas eventualmente podem ter um Presidente, embora isso tenha acontecido apenas algumas vezes na história dos regimes políticos.

            Algumas diferenças, contudo, são essenciais para entender um ou outro tipo de Governo. O presidencialismo não apenas ostenta a figura de um Presidente independente do Parlamento como faz aparecer de forma mais nítida a distinção entre os três poderes: executivo (representado pelo Presidente) legislativo (representado pelo Parlamento) e o judiciário. No presidencialismo todo poder executivo se concentra na pessoa do Presidente que o exerce de forma relativamente autônoma perante o poder legislativo, ajudado por um corpo ministerial que também goza da mesma autonomia em relação ao Congresso. Além disso, no presidencialismo, é o povo quem elege o seu representante maior do poder executivo, através do voto ou sufrágio universal.

            No caso do Brasil a Constituição de 1988 estabelece as atribuições, competências e responsabilidade do Presidente da República nos artigos 84 e 85 (o Capítulo II da carta magna brasileira é o que trata diretamente do Poder Executivo, não apenas do Presidente, mas do Vice-Presidente, dos Ministros de Estado, do Conselho da República e de Defesa Nacional).

Disponível em; SLIDEPLAYER, slide 2 (Acessado em 02/12/2015)

            No caso do Brasil é válido destacar quais foram, ao longo dos anos, as diferentes formas de governo estabelecidas por suas diferentes constituições, desde a Constituição de 1824.

 

Disponivel em: Âmbito Jurídico (Acessado em 02/12/2015)

            Voltando a temática do presidencialismo, nesta forma de governo o Presidente possui atribuições não apenas administrativas mas que podem se estender de alguma forma a esfera legislativa, judiciária, militar e de ordem federativa. Ao Presidente cabe a sanção, veto, promulgação e publicação das leis, bem como existe a possibilidade de editar medidas provisórias (art. 62 da Constituição) com “força de lei”, quando se trata de algum assunto urgente do poder executivo. Quanto ao poder militar o Presidente tem competência para declarar guerra no caso de agressão estrangeira, decretar mobilização nacional, celebrar a paz, exercer o comando supremo das forças armadas, entre outros. Já no que diz respeito ao aspecto jurídico, cabe ao Presidente nomear os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Advogado-Geral da União além de conceder indultos e comutar penas.

            O Parlamentarismo, por sua vez, tem suas origens a partir de um longo processo de desenvolvimento político que se deu a partir da Revolução Gloriosa (1688) na Inglaterra, em luta contra as monarquias absolutistas desde o século XIII até o século XVII. Não se pode dizer que tem início aí o sistema parlamentar, mas sim que ele é o resultado de todo um processo histórico que vai se consolidando ao longo dos séculos e que só instaurou-se de modo definitivo a partir do século XIX. A vitória do Parlamento em 1688 sobre a coroa inglesa foi uma das causas, mas não a única.

Com o século XX e o aprofundamento das convicções democráticas de estrutura do poder, com a igualdade política levada às últimas consequências mediante a instituição do sufrágio universal, com a órbita do poder consideravelmente alargada pelos imperativos da intervenção estatal, com as funções da autoridade cada vez mais dominadas pelas exigências de contato com a opinião, onde o poder consentido descobre as bases seguras de seu processo legitimador, viu-se o parlamentarismo compelido a transformações sensíveis no funcionamento de todo o sistema (BONAVIDES, 2000, p. 428).

            Desta forma, onde quer que se haja firmado os princípios democráticos na base das instituições parlamentares a função de Chefe de Governo compete não mais a um monarca (ficando este apenas como Chefe de Estado), mas ao Parlamento, através da maioria parlamentar ou do partido dominante que chegou ao poder, presidido pelo Primeiro-Ministro, mas cujas ações ficam sujeitas à Câmara dos Comuns[1], eleita pelo povo. No caso do parlamentarismo inglês o Primeiro-Ministro fica com a direção do “gabinete” ao passo que a Câmara dos Comuns tem o controle do aparelho governamental.

 

Referências Bibliográficas

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.

CHEVALIER,  Jean-Jacques. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. 8. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1999.

KANT, Immanuel. Sobre la paz perpetua. Presentación de Antonio Truyol y Serra. 6. ed. Madrid: Editorial Tecnos, 1998.


[1] A Câmara dos Comuns é o nome histórico da câmara inferior do parlamento (o equivalente a Câmara dos Deputados no Brasil, enquanto o Senado seria o equivalente da Câmara Alta). Historicamente a Câmara dos Comuns foi criada para representar politicamente a classe dos “comuns” e era eleita pelo povo, enquanto a elite era representada pela Câmara dos Lordes

 

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