Caravana da Cidadania na Construção da Educação Política nas comunidades rurais de Parintins

PROJETO DE EXTENSÃO REALIZADO EM 2012

 

RESUMO DO PROJETO

 

 

2012 foi ano de eleições municipais. Sabemos que o processo eleitoral surge como um momento indispensável na formação política dos cidadãos na medida em que coloca no palco do debate projetos políticos e sociais e apresenta a possibilidade de importantes mudanças na relação Estado-sociedade. Além disso, é preciso considerar que o processo de formação política das comunidades se revela como poderosa ferramenta de emancipação e autonomia daqueles que desejam perceberem-se como agentes constituidores e transformadores de suas realidades. É no intuito de contribuir para potencializar este momento de reflexão e participação política que realizamos este projeto de Educação Política, discutindo junto com a comunidade da Gleba de Vila Amazônia temas pertinentes a realidade política local, como a Compra/Venda de Votos, a própria ideia de Democracia e suas diferentes possibilidades (Democracia Direta, Democracia Representativa e, sobretudo, a Democracia Participativa), a questão da Cidadania, procurando possibilitar aos indivíduos exercer com segurança o seu papel de cidadão, através do voto, nas eleições municipais. O projeto também se revelou como uma oportunidade de socialização da produção acadêmica local e das expectativas da comunidade acerca do destino político da Região.

 

 

OBJETIVOS

  • Estimular o debate de temas pertinentes à consciência e participação política dos cidadãos parintinenses no processo eleitoral, de forma que estes possam ter um entendimento das mediações presentes na realidade política local, como a Compra/Venda de Votos, a Democracia Participativa, a Cidadania, e o exercício do ato de votar na escolha dos representantes do governo municipal.
  • Promover a formação de uma consciência política e cidadã das comunidades da Gleba de Vila Amazônia;
  • Contribuir para a ampliação do conhecimento dos participantes sobre o processo eleitoral, a participação política, responsabilidades das esferas legislativa, executiva e judicial,

 

JUSTIFICATIVA

O ser humano dá os seus primeiros passos no século XXI, e hoje o seu mundo é marcado por uma intensa crise. O seu cotidiano é marcado pela crise do trabalho, crise social, da violência, do consumo, do neonazismo, do aquecimento global, crise do petróleo, crise da água, enfim, crise da sociedade humana. Mas, não devemos esquecer que ele ainda é o ator transformador de sua própria história. No seu status de cidadão existe a perspectiva da mudança, da revolução, no seu cotidiano traduzido pela dinâmica das relações sociais (ARENDT, 2009)[1]. Todos os momentos da história contaram com a participação desse ator: o cidadão. E não poderia ser diferente na atualidade. O século XXI tem exigido cada vez mais dos cidadãos uma participação mais efetiva e direta no espaço público. As transformações sociais que todos nós gostaríamos de ver realizadas na nossa sociedade não é função apenas dos governos, mas um esforço político de todos, em conjunto. Acontece que, para que essa participação ocorra de forma eficiente e segura, e se efetive uma práxis concreta, é preciso educar-se politicamente: conhecer e compreender os complexos mecanismos que estão por trás das relações de poder.

Desta forma, este projeto de extensão pretendeu levar as comunidades rurais próximas ao município de Parintins – Gleba de Vila Amazônia – a possibilidade de discutir (através de debates, rodas de conversa, encenações cênicas), o papel que cada um de nós deve representar no processo de construção de uma sociedade mais democrática. Um ponto de destaque é que no ano de 2012 tivemos eleições municipais e, desta forma, pretendemos contribuir para potencializar este momento de reflexão e participação política, tanto no que diz respeito à comunidade em geral da Gleba de Vila Amazônia como também aos acadêmicos que participaram do projeto. Tal projeto permitiu articular tais atividades com os conteúdos trabalhados em sala de aula e as problemáticas norteadoras da realidade política e social no âmbito regional, estadual e nacional.

Entendemos que a formação política deve ser estimuladora do exercício crítico, superando o dogmatismo e a retransmissão de verdades prontas. Sua metodologia deve adotar como base a pluralidade de visões e interpretações existentes na sociedade, fazendo do debate, da dúvida e da polêmica uma estratégia sempre presente nas atividades públicas. Este espaço coletivo de reflexão, promovido por este projeto, pretendeu fornecer um ângulo adequado para captar as mudanças, os conflitos e as perspectivas do futuro político desta Região.

Entre as diferentes temáticas abordadas neste projeto estava a ideia de discutir a própria Democracia e a participação da sociedade dentro desse tipo de organização política. De um lado nós temos a ideia de uma Democracia Direta que, em um país de dimensões continentais como o Brasil se torna praticamente inviável. Por outro lado, nós temos a Democracia Representativa, onde a sociedade escolhe, por meio do sufrágio universal, aqueles que devem representar seus interesses na esfera executiva e legislativa do poder público e que em certo sentido tem-se mostrada insatisfatória, pois os interesses políticos partidários e ideológicos estão sempre à frente dos interesses sociais. Entre a Democracia Direta e a Representativa, temos a Democracia Participativa, que pode ser definida como uma forma de governo em que a sociedade deve tomar para si os espaços de poder, criando mecanismos de participação efetiva da sociedade nestes espaços (GALVÃO; MEFFE, 2010)[2]. Dentro desta temática analisamos, discutimos e debatemos as diferentes formas de participação efetiva da sociedade no campo político, levando em consideração aquilo que Boaventura de Sousa Santos (2002) chama de redemocratização dos espaços públicos e de poder.

Na temática relativa a Cidadania, entende-se que a consciência política e cidadã se forma no exercício de sua prática e o século XXI, como já frisamos, tem exigido cada vez mais um indivíduo participativo e envolvido nas questões políticas e sociais (uma cidadania participativa como efeito direto de uma Democracia Participativa). É com a ideia de uma cidadania que se caracteriza pela participação do indivíduo na coisa pública (ARISTÓTELES, 1999; ROUSSEAU, 1978)[3] que procuramos fortalecer essa consciência política e cidadã.

É preciso que nós cidadãos tenhamos bem claro também as diferenças entre o Poder ExecutivoPoder Legislativo pois acreditamos, por exemplo, que muitas vezes o poder legislativo é cobrado pela sociedade a realizar ações que não compete a sua esfera de poder. É preciso ter claro quais são as atribuições, de fato, do poder executivo e o legislativo e como forma de trabalhar as competências relativas a cada esfera de poder utilizamos a Lei Orgânica Municipal de Parintins (2009) e o Regimento Interno da Câmara Municipal de Parintins (2009).

O voto consciente e a compra/venda de voto são temáticas imprescindíveis dentro deste processo de conscientização e educação política. Para exercer nossa cidadania de forma consciente e segura através do sufrágio universal é preciso saber em quem votar e porque votar: votar com conhecimento de causa, com conhecimento das propostas de governo e da atuação política de um determinado candidato. Além de considerar que, aquele que vende o seu voto, beneficia muito mais aquele que compra, do que a si mesmo, além de causar imensos prejuízos à sociedade.

Além disso, os resultados de uma série de pesquisas do meio acadêmico brasileiro, desde a década de 1960, revelam que o eleitorado brasileiro não vota tomando como base os projetos e Ideologia Política de candidatos e Partidos Políticos (SINGER, 2000). Especialmente nos períodos de maior instabilidade da estrutura partidária, com dificuldades de identificação de estruturas ideológicas estáveis, o voto da população tem tido caráter personalista, estando a população sujeita à mobilização e manipulação por parte de lideranças políticas de tipo clientelista, eleitoreira e populista. Assim, o comportamento eleitoral conservador e diferente em relação aos chefes políticos locais, expresso no voto situacionista e imediatista, tem caracterizado principalmente as populações mais marginalizadas e os setores rurais mais empobrecidos, onde as disputas políticas e o “coronelismo” das famílias mais abastadas, embora em declínio, ainda vigoram (SINGER, 2000).

Por fim, gostaríamos de reafirmar que o indivíduo se anula perante a coletividade e não se faz partícipe deste processo, quer dizer, não assume seu papel de ator social – de cidadão, no sentido aristotélico e rousseauniano –, por lhe faltar um mínimo de cultura e educação política necessária para a conscientização do processo do qual faz parte. Ele necessita da reflexão sobre quem é e a que grupo pertence. Quando realmente se encontra como cidadão participante de uma sociedade, ou tem consciência de que a sua participação tem importância na construção dessa sociedade, deixa de se anular para participar dela. Toma consciência de que a realidade social existe como produto das ações humanas e que são os homens, produtores desta realidade, que transformam a realidade e o mundo a sua volta, em sua práxis (Freire, 1987).

 

BIBLIOGRAFIA

ARISTÓTELES. A Política. Martins Fontes. São Paulo, 1999.

ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009.

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.

CÂMARA MUNICIPAL DE PARINTINS. Disponível em: . Acessado em: 01/03/2011.

CHÂTELET, Fraçois; et all. História das idéias políticas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985.

FORTES, L.R.S. O Iluminismo e os Reis Filósofos. São Paulo, Brasiliense, 1981.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 31. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE PARINTINS. 3. ed. Parintins-AM: Câmara Municipal de Parintins, 2009.

REGIMENTO INTERNO DA CÂMARA MUNICIPAL DE PARINTINS. 3. ed. Parintins-AM: Câmara Municipal de Parintins, 2009.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social; Ensaio sobre a origem das línguas; Discurso sobre as ciências e as artes; Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. São Paulo: Civilização Brasileira, 2002.

SINGER, André. Esquerda e Direita no Eleitorado Brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2000.

 



[1] Em sua obra A Condição Humana, no capítulo que aborda a ação como elemento concretizante do ser humano, Arendt nos conduz por um fio reflexivo sobre a capacidade única de o homem ser um ente ativo e capaz de influenciar no viver da coletividade.

[2] Carlos Galvão e Corinto Meffe trabalham ainda com o conceito de Plano de Gestão Cidadã, segundo os quais consiste em “uma ponte entre os poderes autônomos das comunidades, criando a possibilidade de um nível de interlocução com o poder tradicional constituído” (2010, p. 16). A idéia é pensar em novas alternativas para a democracia na gestão municipal com a participação popular. Este Plano de Gestão Cidadã “foi o resultado de uma série de discussões iniciadas em 1992, quando um grupo de estudantes universitários optou por não mais apenas criticar a situação política social, mas por pensar em como cidadãos comuns podem planejar e intervir em seus espaços existenciais: suas cidades” (ibidem, p. 77).

[3] Para o filósofo grego Aristóteles o cidadão é, sobretudo, o indivíduo que participa da coisa pública (res pública); é cidadão aquele que possui uma participação efetiva e está sempre em relação com o Estado. Tal como Aristóteles, Jean-Jacques Rousseau, filósofo do iluminismo francês, entende que o cidadão não é simplesmente o habitante do burgo (bourgeois); um indivíduo não é cidadão pelo simples fato de residir numa determinada cidade, mas o é quando envolve-se politicamente nos problemas coletivos e busca suas soluções, quando participa da criação política da Cidade. A “natureza” do cidadão é eminentemente política, em outras palavras, é o “animal político” aristotélico.

 

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